Oppa ChuNan Style!“Em 1965, os Beatles foram nomeados como membros da Ordem do Império Britânico. Os integrantes do grupo pop que abalou o mundo com sua música poderosa foram condecorados como escudeiros, o grau imediatamente abaixo de cavaleiro. Hoje em dia, se a República da Coreia atribuísse título de cavalaria equivalente ao britânico para uma celebridade coreana, a primeira pessoa da lista seria o ator-cantor Ahn Jae Wook (An, Jae-uk), que pode ter realizado algo que nenhum político, empresário ou diplomata jamais fizeram pela nação. (Choe Yong-sik, jornalista do Korea Herald, 2001)
Em meados de julho estourou na internet o clipe de uma celebridade sul-coreana de segundo escalão. Alguns meses depois, Gangnam Style do Psy é o vídeo com mais curtidas na história do Youtube e caminha a passos largos para destronar Justin Bieber e levar para Seul também o título de vídeo com mais visualizações no site. Para dar dimensão do número alcançado até o momento em que redijo este texto, Gangnam Style, um clipe em coreano sem legendas, foi assistido por um volume de pessoas correspondente à soma da população de Estados Unidos, Brasil, Japão, Alemanha e Coreia do Sul.
Uma dança engraçada, um gordinho carismático e uma melodia adesiva, apenas mais uma sub-celebridade gozando seus 15 minutos de fama, categoriza o mais cético. Um clipe tão impactante quanto fugaz, que fez sucesso apesar de ser coreano e não por causa disso, opinam quase todos. O histórico de memes efêmeros que pipocam diariamente pela internet e somem com a mesmo velocidade parece conferir substância a estes argumentos. Mas o sucesso do Psy se resume nisso? Você nunca percebeu que a Coreia do Sul está dia após dia mais presente na sua rotina? Seu celular possivelmente é um Samsung, seu monitor provavelmente um LG. Você é mais impactado por propagandas da Hyundai do que da FIAT ou Volkswagen. Alimentos como os sorvetes Melona são facilmente encontrados em pontos de venda não-orientais. A tecnologia da linha amarela do metrô de São Paulo é toda coreana. Fora do Brasil, um show de músicos coreanos colocou sete mil franceses no Le Zénith de Paris. O grupo Big Bang por dois anos seguidos figurou no top 10 do iTunes nos EUA. Você notava isso… cinco anos atrás? Reforço o questionamento. Você ainda acha que a febre de Gangnam Style foi meramente fruto do acaso?
Psy é apenas o pico de sucesso de um acontecimento crônico conhecido comoHallyu, a onda coreana. O termo classifica a rápida popularização internacional da cultura sul-coreana a partir dos anos 90, primeiro no continente asiático, depois no Oriente Médio e norte da África, e por fim, ainda timidamente, na América e Europa. Só em 2011, a Coreia movimentou US$ 4,2 bilhões em exportações de produtos culturais. O governo sul-coreano já investiu quase US$ 1 bilhão – em medidas de promoção e proteção da propriedade intelectual – na construção de centros de estudo e divulgação da cultura coreana mundo afora. Internamente, centenas de milhares de empregos diretos ou indiretos são sustentados por esse mercado.
O pop coreano, filho da globalização que permitiu a livre circulação de bens, é apenas um dos braços com os quais governo e empresas da península asiática estão internacionalizando sua economia nacional para enriquecer. Não foi coincidência que tantos brasileiros assistiram ao Ronaldo dançando Gangnam Style em seus televisores LG. Os coreanos têm planos ambiciosos e metas agressivas. Nesse post, pretendo demonstrar como a onda coreana – na esfera cultural – está ganhando o mundo e as projeções para o futuro deste movimento tão atual, que ainda não conseguimos olhar em perspectiva e sobre o qual só podemos especular. Não existem fórmulas para criar um sucesso pop garantido, mas ele só chega aos que estão preparados para criar e receber, como muito bem ensinaram os filmes americanos, as músicas britânicas e os games japoneses no século XX. A Coreia do Sul quer entrar neste seleto grupo de exportadores culturais. Quer saber como? Vem comigo! O texto é grande, favorite e leia aos poucos se achar mais confortável.
A PRIMEIRA ONDA – HALLYU 1.0
Tropas americanas e das Nações Unidas ocuparam a Coreia do Sul durante a Guerra Civil do país nos anos 50, deixando na península resíduos culturais. Posteriormente, soldados coreanos que auxiliaram o esforço de guerra americano no Vietnã voltaram para seu país de origem trazendo uma miscelânea de influências musicais: o rock e o folk dos Estados Unidos, o enka do Japão, ritmos latinos e cubanos, além de melodias de origem italiana e francesa. Com o processo de redemocratização entre os anos 80 e 90 (A Coreia do Sul era então um regime militar) e a flexibilização das leis que limitavam a entrada de conteúdo estrangeiro, esperava-se na Coreia uma invasão e dominação das culturas americana e japonesa em detrimento da nacional. Contra todas as previsões, no início dos anos 90 músicas nacionais tomaram os rádios, doramas se enraizaram na programação televisiva e filmes coreanos não foram sufocados por Hollywood. Com o aprendizado obtido no contato com os estrangeiros, os coreanos conseguiram produzir frutos culturais bons o bastante para agradar o mercado interno nos anos 90. Eis que veio a Crise Asiática de 1997…
A crise que afetou tigres e tigrinhos asiáticos erodiu a economia coreana. Acostumados com a lógica produtivista de criar objetos tangíveis (carros, navios, circuitos eletrônicos), a crise obrigou os coreanos a mergulhar em novas possibilidades do capitalismo, dando mais atenção ao financeiro e especulativo no desenvolvimento de uma nova cultura industrial. Para a economia sul-coreana, não bastava mais exportar chips, era preciso desbravar novos mercados e novas possibilidades. Nesse ponto, empresários e governo coreanos enxergaram na sua cultura pop e nacional uma potencial mina de ouro.
Diferente do Japão, a população sul-coreana é pequena comparada aos países vizinhos, menos de 50 milhões de habitantes. Isso significa que o mercado interno do país é muito pequeno. Qualquer empresário que espera ganhar quantias significativas de dinheiro na Coreia precisa olhar para mercados externos. É assim com celular Samsung e com CD do Big Bang. Financiar a Hallyu não foi um luxo, e sim uma necessidade comercial. Como afirma Bernie Cho, líder de um selo de distribuição musical: “Muitos artistas de alto nível fazem mais dinheiro em uma semana no Japão do que em um ano inteiro na Coreia”. Isso ajuda a explicar por que o pop japonês encontra hoje dificuldades de exportação (seu mercado interno ainda é grande o bastante, muitos empresários se agarram nesse porto seguro e produzem produtos só para público japonês – a indústria de animes dá tiros de canhão no pé com essa postura), enquanto o coreano cresce de modo substancial (o imperativo da exportação obriga os coreanos a considerarem as demandas dos mercados internacionais – saibam, Super Junior foi criado sob medida para agradar o público chinês).
A crise não apenas abriu os olhos dos coreanos, mas também implodiu a economia dos países vizinhos, que, ainda incapazes de produzir cultura de qualidade internamente, também não tinham dinheiro para gastar com o caro pop americano ou japonês. O terreno estava pavimentado para a invasão de Seul… e os pioneiros dessa empreitada foram os doramas!
A onda começou na China com a exibição de What is Love em 1997 e Wish Upon a Star em 1999, grandes sucessos de audiência. Na cola deles, grupos musicais coreanos como H.O.T., NRG, BABY V.O.X. e S.E.S. conquistaram não só a China, mas também Taiwan, Hong Kong e Vietnã. O próprio termo Hallyunasceu na mídia chinesa. Algumas versões dizem que o nome veio de uma coletânea de músicas coreanas lançada no mercado chinês no período. Outras dizem que o termo apareceu em 1999 num jornal chinês quando o H.O.T. fez uma apresentação em Beijing. Detalhe: o termo, nessa versão, teria na verdade um tom cínico, numa alusão lingüística que brinca com o termo “Onda fria”.
A brincadeira ganhou proporção com a conquista do mercado japonês a partir da exibição de Winter Sonata em 2003. Para que vocês tenham noção do sucesso, Junichiro Koizumi, então Primeiro Ministro da segunda maior economia do mundo, brincou, mencionando o protagonista coreano: “vou fazer um grande esforço para que eu possa ser tão popular quanto Yon-sama e ser chamado de Jun-sama” [Yon-sama foi o apelido japonês dado ao protagonista]. Winter Sonata mexeu com a atual crise social da nação japonesa e balançou a visão histórica que os nipônicos tinham dos coreanos como um povo inferiorizado:
“Modismos vêm e vão no Japão, mas este toca vários problemas na sociedade japonesa e em sua relação com a Coreia do Sul. Em uma sociedade dominada por um mal-estar generalizado, onde a incerteza e o pessimismo preenchem as revistas com manchetes sobre homens e mulheres que não se casam, não têm filhos, não fazem sexo, Yon-sama parece abordar a nostalgia japonesa (…) sobre os anseios de mulheres de meia-idade em busca de uma conexão emocional que lhes falta, e, talvez, acreditam não poder encontrar no Japão.” (Norimitsu Onishi, para o New York Times, 2004)
Paralelamente a Hallyu conquistou outros mercados. Novelas coreanas passaram a ser exibidas em países como Arábia Saudita, Rússia, Nigéria, Colômbia, Israel, Bósnia, Turquia e EUA (para citar apenas alguns países de culturas diametralmente opostas que receberam igualmente bem a produção coreana). No Irã, a novela Dae Jung Geum atingiu 86% de audiência nacional, chegando a 90% na capital Teerã.
Na onda dos doramas, grupos de Kpop, com auxílio do marketing assertivo das agências e do financiamento e proteção do governo nacional, começaram a gravar discos também em chinês e japonês, para facilitar a penetração nestes mercados. A cantora BoA é o principal nome deste momento da música pop coreana (e quase todos vocês devem ter conhecido ela por Every Heart, encerramento de Inu-Yasha cantado em japonês).
O interesse inicial por novelas e músicas coreanas levou a uma crescente curiosidade dos povos vizinhos pela cultura coreana de um modo geral: alimentação, língua, história e produtos culturais tradicionais passaram a ser conhecidos e consumidos. O estilo urbano de Seul, como moda, padrões de comportamento e consumo, começaram a ser imitados. O turismo para a Coreia do Sul, um alvo pouco lembrado por viajantes internacionais, aumentou sensivelmente, e pacotes de viagem que levam fãs para conhecer ídolos e set de filmagens locais são sucesso na Ásia. Em casos extremos, a própria febre por cirurgia plásticas (um problema social na Coreia) é consumida por estrangeiras, que procuram cirurgiões coreanos para ganharem a aparência de alguma estrela do stardom sul-coreano.
Podemos concluir que a primeira onda de cultura coreana nos anos 90 e início dos anos 2000 foi um resultado do fim da polarização política da Guerra Fria e início da globalização (que permitiu a circulação de produtos culturais de um país periférico como a Coreia do Sul), da pequenez do país (percepção da necessidade de internacionalização) e do esforço conjunto de empresários e governantes para transformar a cultura do país, nacional e industrial, em um produto a mais a ser ofertado nos mercados externos para incrementar a economia do país como um todo. Isto é, o mundo mudou e os coreanos souberam surfar na onda gerada pelo abalo sísmico causado pela queda da União Soviética. Outro abalo aconteceu nos últimos anos e mudou o pop coreano de modo estrutural: a democratização da internet pelo mundo. Apresento-lhes a Hallyu 2.0.
A SEGUNDA ONDA – HALLYU 2.0
Se na primeira onda os pioneiros foram os doramas (apenas seguidos pela música pop), na segunda onda a ordem se inverte. O entusiasmo maior está sendo gerado por grupos de música pop como KARA, Girls Generation, Big Bang, SHINee, Super Junior, 2NE1, f(x), Wonder Girls, 2PM e MBLAQ, para citar alguns dos principais; todos agenciados por grupos empresariais como as três irmãs S.M. Entertainment, J.Y.P. Entertainment e Y.G. Entertainment. Além disso, a Hallyu 2.0 é tipificada pela participação da internet – e das redes sociais – no processo de divulgação, ferramenta essencial na manutenção e crescimento da onda, principalmente do Kpop. Qual a importância da internet?
Primeiro, a internet deu maior poder de escolha ao público. Até um passado muito recente, ainda com o predomínio das mídias tradicionais (TV, rádio, cinema, revista, jornal), o capital tinha muito poder na hora de decidir o que o público iria consumir. Não era fácil para uma indústria cultural periférica como a coreana bater de frente com estúdios e gravadoras de EUA, Inglaterra e Japão, não só pela qualidade indiscutível destes concorrentes, mas também pelos métodos de sustentação do poder econômico que o capital acumulado deles proporcionava (jabá, controle acionário dos grupos midiáticos e etc.). Além disso, mídias tradicionais precisam de produtos culturais que movimentem altos volumes de dinheiro, logo, que sejam consumidos por um número grande de pessoas, deixando pouco ou nenhum espaço para os nichos. Na internet o usuário busca e compartilha de modo legítimo o que lhe agrada, sem pretensões comerciais. Você, leitor do ChuNan, consumidor compulsivo de animações japonesas que é, deve entender o que estou falando… se dependesse da Globo, você não assistiria animes da temporada. Nem mesmo títulos de primeira grandeza como Evangelion ou Hunter x Hunter. Teria que se contentar com Naruto e olhe lá.
A internet também possibilitou o compartilhamento de um volume muito grande de informação de modo instantâneo e gratuito (novos fãs) de uma música multisensorial. O Kpop não é só um ritmo dançante e uma melodia grudenta, ele conta também com a habilidade de dança dos integrantes, figurino estilizado e beleza física e juvenil. Um trunfo do Kpop na era do Youtube.
O último ponto, e não menos importante, é a relação do público com as agências e seus ídolos. Na Hallyu 1.0, os coreanos produziram um pop agradável, mas o consumo dele era mais passivo, as pessoas recebiam o que as agências acreditavam que elas queriam (e de certo modo, elas acertaram). Hoje os fãs empenham papel ativo no movimento como co-criadores. Por exemplo, enquanto as agências buscavam produzir músicas em outros idiomas para agradar públicos internacionais, elas descobriram que parte desse mercado demandava as músicas originais em coreano, desse modo, o Big Bang promoveu seu álbum nos EUA em coreano. Flashmobs e interação nas redes sociais mostram novos focos de demanda, como Argentina, Peru e Cazaquistão, que estão recebendo ou estão para receber shows dos grupos sul-coreanos.
Falando um pouco em números, a 2.0 também aumentou em proporção. Girls Generation tocou para mais de 140 mil japoneses, vendendo meio milhão de álbuns nesse mercado. Sobre a internet (ainda pré-Psy):
“O principal jornal coreano, JoongAng Ilbo, publicou um artigo em Janeiro de 2011 analisando um total de 923 vídeos de cantores coreanos das três maiores agências de entretenimento que foram postados no Youtube (…) De acordo com a análise, usuários de internet de 229 países assistiram aos vídeo 793.57 milhões de vezes em 2010. Por continente, o número bateu a marca de 566.27 milhões na Ásia, 123.47 milhões na América do Norte e 55.37 milhões na Europa. Por nação, o Japão vem em primeiro com 113,53 milhões, seguido pela Tailândia com 99.51 milhões e os Estados Unidos com 94.87 milhões.” (No Brasil, pouco mais de 6 milhões, número superior ao alemão, mas inferior ao saudita)
A FORÇA DO POP COREANO
Ok, você diz, já entendi o contexto histórico do surgimento da onda coreana e percebi que ela tem forças impressionantes. Sei que há esforços de instituições diversas para a sua popularização. Mas nada faz sucesso sem méritos. Quais são os méritos do pop coreano? O que nele conquista as pessoas? É, não sei. Ninguém sabe ainda. Pelo menos não com certeza. Há teorias diversas defendidas em simpósios pela Coreia do Sul. Existem perspectivas nacionalistas, pós-coloniais, neoliberais, entre outras. Não vou me prender a escolas de pensamento, apenas pincelar algumas visões mais bem aceitas ou propagadas.
Há argumentos de que o que faz sucesso nos produtos da Hallyu é a ‘sensibilidade coreana’. O alicerce moral da cultura nacional deles é o Confucionismo de origem chinesa. Entre os principais pilares dessa moralidade estão a valorização dos laços familiares e da harmonia na sociedade. O pop coreano teria mantido esses princípios morais que dialogariam positivamente com os demais países influenciados pela mesma moralidade, justificando principalmente o estrondoso sucesso dos doramas na Ásia. Eles fariam um contraponto às produções individualistas e violentas de origem ocidental ou japonesa, se apresentando como uma novidade em termos de estética e roteiro. Mas isso não explica o sucesso, ainda que moderado, daHallyu fora da Ásia confucionista, nem cobre com um pano as produções coreanas de sucesso igualmente sensacionalistas ou violentas.
Outros afirmam que o pop coreano de qualidade encontrou espaço aberto nos países com sentimentos anti-japonês e anti-americano da Ásia. O Japão barbarizou algumas regiões nos tempos do Império, impôs medidas de aculturação forçada e certas feridas históricas ainda não foram cicatrizadas. Em países de passado ou presente Comunista, o sentimento contra Japão e EUA é ou foi institucionalizado no discurso do Estado e propagado nos livros didáticos. A Coreia do Sul, por outro lado, não seria enxergada como uma ameaça física ou cultural. Este argumento talvez funcione para a China, mas se choca com os fatos de que o Japão e os EUA são culturas pop presentes há muito mais tempo e com mais intensidade nos próprios países que um dia açoitaram (ou são acusados de terem açoitado) na Ásia.
Um terceiro argumento é da Hallyu como resultado de um colonialismo cultural. O pop coreano seria apenas uma cópia sem identidade das culturas estrangeiras, que jamais conseguiria sair da sombra dos EUA e da Europa Ocidental, pois luta com as mesmas armas, só que mais antiquadas, com menos munição, menos experiência de guerra e em terreno menos propício. Não haveria futuro para a Hallyu sem se desvincular de uma tradição cultural que não é a coreana, esta, que aos poucos estaria sendo morta pela cultura pop. Financiar a Hallyu seria uma morte em duas frentes; ela fracassaria, e levaria consigo a cultura nacional do país. Uma visão a meu ver muito fatalista e retrógrada de cultura.
A explicação comercialista não tenta encontrar verdades ocultas. Essa perspectiva enxerga a cultura como um produto, produto como dinheiro, e dinheiro como prosperidade. Cultura seria um elemento competitivo no comércio internacional e o sucesso é garantido com a plena execução de estratégias bem elaboradas de regulamentação da qualidade dos produtos daHallyu, distribuição global contínua por meio da produção em maior escala e desvinculação da Hallyu com o fervor nacionalista. Nessa visão, enlatados culturais não matariam a cultura coreana, ao contrário, preparariam o terreno para a expansão e perpetuação dela, como Godzilla teria feito por Kurosawa pelo Japão. Cultura pop e cultura nacional andariam de mãos dadas em prol da Coreia do Sul, não haveria por que temê-la. Mas bastaria querer e ter dinheiro para conseguir despertar um carinho significativo em tantas culturas diferentes? Então por que outros não conseguiram o mesmo? Visão dinheirista demais, parece subestimar elementos culturais e a postura ativa dos receptores dela.
Não há consenso quanto a isso. Todos os argumentos parecem ter fragilidades e não se explicam por si só. Algo mais próximo da realidade talvez esteja na intersecção desses e outros elementos ainda não explorados. Mas vou tentar apresentar alguns argumentos favoráveis aos elementos internos da Hallyu, dos dois embaixadores da onda: doramas e Kpop.
“Os K-doramas oferecem entrelaçados temas de família, romance, amizade, artes marciais, guerras e negócios, e são vistos como capazes de lidar com os ‘seguros’: eles são menos explícitos comparados aos americanos, e aderem relacionamentos de um modo mais afetivo e significativo, mais emocional do que sensual (…) Um olhar mais atento mostra que diferentes novelas são populares em diferentes países por razões diversas. Americanos acham os doramas coreanos relaxantes e alegres; europeus acham os roteiros descomplicados e românticos. Asiáticos, por sua vez, descobrem estilos de vidas e tendências que pretendem imitar. A repressão sutil das emoções e intensa paixão romântica sem excesso de sexualidade ressoa entre os espectadores do Oriente Médio.”
Os doramas mostraram um estilo de vida moderno e próspero, além de vender o povo coreano como sofisticado, educado e digo de respeito. Em países como Japão e China, potências regionais, serviu para quebrar um pouco os preconceitos e estereótipos. Em países mais pobres ou com passado/presente comunista, como o Vietnã, venderam um padrão de vida próspero e saudável, logo, desejável, aspiracional.
O Kpop, por outro lado, é sustentado por uma indústria fonográfica muito boa em vender sensações, algo que combina com o hedonismo contemporâneo (ou com a visão pós-moderna de alguns):
“Na Coreia nós usamos músicas e performances muito poderosas. Tudo deve ser perfeito. A música pop japonesa não tem movimentos adoráveis nem performances poderosas, mas na Coreia você deve ser o maior e… se você quer ser adorável, você tem que ser muito adorável. Se quer ser sexy, tem que ser muito sexy” (Joy, do grupo Rania)
As agências buscam talentos cedo, e não só na Coreia, mas na China, Japão, Tailândia, EUA e Canadá, principalmente. Artistas coreanos são espartanamente selecionados e treinados para não apenas cantar e dançar, mas aprender línguas e culturas estrangeiras, como se expressar, como se portar em público, como atuar. Rain, por exemplo, além de cantar, também atuou em filmes como Speed Racer e Ninja Assassin. O stardom sul-coreano é muito seletivo, e com tanto treinamento holístico, dificilmente erra em atender as demandas do seu público.
Mas será que tudo são flores?
GANGNAM STYLE:
PSY É UM ICONOCLASTA?
Qualquer ocidental que acompanhou a tradução de Gangnam Style bateu o martelo: essa letra tem a profundidade de um pires. Analistas coreanos, em contrapartida, observaram nuances que qualquer pessoa que nunca esteve na Coreia jamais poderia captar. Com o clipe, Psy estaria parodiando o estilo de vida de Gangnam, pequeno bairro dos endinheirados de Seul, sede de empresas e lojas de grife, local criador de tendências. 7% do PIB nacional concentrado em poucos km². Mais do que isso, Psy estaria ridicularizando as pessoas que aspiram ao estilo de Gangnam, isto é, que querem fazer parte dele, mas não tem poder financeiro nem status social para tal. Daí – no vídeo – ele se veria numa hípica de um campo de polo (junto com o golfe, o esporte símbolo dos ricos), mas depois percebe que está apenas dando voltas num cavalinho de carrossel. Ou que ele está se bronzeado numa praia, para depois perceber que está bancando o ridículo num playground. Estaria Psy marretando ídolos?
O Kpop é uma cria de Gangnam. As principais agências de entretenimento que engendraram o estilo estão sediadas lá. HyunA, membro do 4minute, a ruivinha do metrô que cavalga em cima do Psy, é contratada da Cube Entertainment de Gangnam-gu. Juntos, gravaram uma versão da música pelo ponto de vista feminino, e oppa Gangnam style foi substituído por oppa is just my style. O estilo juvenil e fashion de Gangnam que ela de fato faz parte e ajuda a propagar. Nessa nova versão sai do palco o humor bufão e entra a sedução ao tempero asiático, pernas finas de fora, aegyo no refrão e um estilo infantilóide de provocar. Sobre a participação dela no clipe original, Psy relata sem falsa modéstia:
Ela super não fazia esse tipo de coisa antes. Ela perguntou: ‘Por quê? Por quê? Por que eu fiz isso…?’ Estava se perguntando ‘o que é isso? Ele fica me pedindo para fazer essa merda idiota. Eu não faço ideia. Do que você está falando?’ Em certo ponto ela percebeu o que estava acontecendo e disse: ‘Ah, Psy, seu idiota! Isso é genial, é demais!’ Foi isso que ela me disse no meio do clipe. E aí ela fez certo.”
Onde eu quero chegar? A avacalhação de Psy pode não estar direcionada apenas de modo geral ao estilo de vida glorificado pela região de Seul, mas ao próprio sistema de manufatura de ídolos do qual ele faz parte. Park [seu nome verdadeiro] é uma espécie de ovelha desgarrada desse sistema; na casa dos 30, gordo, com pouco a oferecer em termos de capital estético, já foi detido por porte de maconha, fugiu do serviço militar obrigatório do país e testemunhou álbuns seus sendo censurados e banidos na Coreia. 1/5 disso seria mais do que justificativa para a rescisão contratual de uma estrela dostardom coreano. Falemos um pouco dele.
Precisão e conformidade diferenciam o Kpop. Para a criação dos grupos, as agências [diferente do Ocidente, onde músicos são cuidados ou produzidos pelas gravadoras] precisam investir alguns anos e milhões de dólares em treinamento. Grupos atuais com sete membros inicialmente tinham 40 ou 50 jovens (alguns muito jovens) que foram pré-selecionados, mas acabaram excluídos um a um, sobrando apenas os mais aptos. A rotina de treinamento normalmente ultrapassa as 12 horas diárias, impedindo contato com família e amigos. Relações amorosas são proibidas por força de contrato. Membros do grupo Rania, por exemplo, não podiam ter telefone celular antes da estreia.
Apesar da rotina sobrecarregada, as celebridades mais proeminentes costumam ser relativamente respeitadas por suas agências, não apenas pela exposição midiática a qual estão expostas, mas pela fonte de renda que representam. Por outro lado, inúmeras agências menores são acusadas de propor contratos fáusticos para jovens – iludidos pelo sonho da fama – que ainda nem teriam condições de julgar a validade de cláusulas tão amarradas presentes nos contratos que fecham ainda na adolescência. São pactos com duração superior a 10 anos, com termos invasivos em suas vidas pessoais.
O Strait Times, jornal de Singapura, denunciou que a Alpha Entertainment veta contratualmente a ingestão de alimentos e água após as 19h, bem como proíbe que seus pupilos saiam sem supervisão. De vez em quando os conflitos atingem até os grupos mais famosos. Han Geng, ex-Super Junior de origem chinesa, processou o ‘Grande Arquiteto do Kpop’, empresário Lee, por ser forçado a trabalhar dois anos seguidos sem um único dia de folga, ter ficado doente por conta disso, e não ter sido recompensado proporcionalmente de acordo com a lucratividade que ajudou a gerar – tudo baseado num contrato com duração de 13 anos assinado aos 18. O tribunal sul-coreano deu ganho de causa para o jovem.
De modo curioso, Psy foi o primeiro coreano a genuinamente bombar nos Estados Unidos, e conseguiu isso justo com uma chacota sobre o estilo ao qual ele supostamente está servindo como porta-voz. No final do clipe, ele canta triunfante em seu trono hip hop – estilo tão emulado pelos cantores da Coreia – para depois compreender que ele está pagando de bacana em uma… privada.Ainda no começo, ele dança contra o vento com uma beldade sob cada braço, mas a sequência é pitoresca. Lixo é arremessado na cara deles e as moças demonstram evidente desconforto com a situação, enquanto um Psy impassível se deleita com seu momento de gangsta, totalmente desconectado do que acontece ao seu redor. Ludibriado. Encantado demais para olhar em volta.
Não só uma zombaria com as coreanas que andam de costas para perder peso e perseguem o padrão de beleza do mainstream, ou com aquelas que economizam no almoço para se sentirem elegantes e superiores bebendo café no Starbucks com o dinheiro (!) – como enumera Jea Kim, responsável pelo blog Dear Korea.Talvez o estilingue do Psy mire também as pessoas (os ídolos pop juvenis) que ajudam a construir esse arquétipo de glamour que almeja a eterna juventude, elas próprias vítimas do mito que arquitetam; afinal, os dois lados dessa moeda – ídolos e fãs, ou se preferir, produtores e consumidores – estão dispostos a passar pelo crivo do bisturi para se adequarem a ele (a Coreia do Sul é o país onde mais se faz, proporcionalmente, cirurgias plásticas).
Requisitei a imagem do estilingue porque obviamente Psy não usou nenhuma arma letal. Sua crítica não tem qualquer pretensão destrutiva ou reformista, ao contrário, sua intenção foi fazer as pessoas darem risada com o clipe, entreter. Está aproveitando como ninguém o sucesso proporcionado por essa indústria de ídolos. O rolo compressor de Gangnam Style não está destruindo ídolos, ao contrário, de bom grado está na dianteira abrindo caminho para eles. Não sem um traço de deboche.
HALLYU NA COREIA DO NORTE
A onda coreana hoje consegue banhar até os lugares mais improváveis do mundo, como o regime ditatorial norte-coreano, talvez o país no mundo que mais controla o fluxo de informações. Doramas entram de forma clandestina, principalmente via China, ajudados pela corrupção generalizada dentro do país. Num verdadeiro processo de escambo, onde pessoas trocam arroz por mídias com novelas gravadas, informação do Sul está penetrando aos poucos no vizinho do norte. Lideranças de Pyongyang tem motivos suficientes para se preocupar, pois as novelas servem como uma divulgação de um estilo de vida mais próspero do que aquele fornecido à população pela dinastia Kim. No país, ter posse, alugar ou emprestar conteúdo visual de origem sul-coreana é crime passível de punições como prestação de serviços forçados ou mesmo cadeia. A resposta do Estado para a produção e/ou divulgação massiva desse tipo de material pode ser mesmo a Execução em público.
A geração Jangmadang [pessoas que estão na faixa dos 20-30 anos] não parece se importar como as passadas. Passaram sua juventude durante a ‘Marcha da Tribulação’ [período entre 94 e 98 onde a Coreia do Norte sofreu com uma crise de abastecimento alimentício, e centenas de milhares - outros dizem milhões – morreram de fome ou por problemas dela decorrentes] e muitos já não nutrem a mesma simpatia pelo Estado ou pelo Juche [a ideologia oficial do Partido Comunista criada por Kim Il Sung, que, segundo eles, seria uma evolução do próprio pensamento marxista]. Escaldados pela fome de outrora, tendo como prioridade o acesso seguro à alimentação, e conhecendo clandestinamente o estilo de vida dos irmãos do sul, essa geração já apresenta focos de resistência passiva ao sistema retrógrado dos Kim. Não hesitam em optar pelo mercado do contrabando para garantir sua subsistência e alguns luxos. Há relatos de jovens norte-coreanos imitando cortes de cabelo e dança dos doramas do sul. O governo de Seul não poderia ficar mais feliz.
ANTI-HALLYU?
No Japão, um dos principais mercados para a Hallyu, está acontecendo uma movimentação no sentido oposto: a anti-Hallyu. Tudo começou quando o ator Takaoka Sasuke foi demitido pela sua agência por criticar no Twitter a predominância de programas de origem coreana transmitidos pela Fuji TV. A discussão fomentada pelo caso ganhou tons de rivalidade política. No dia 21 de Agosto, em torno de seis mil japoneses se reuniram na sede da emissora para protestar. A acusação é de que não existe onda coreana alguma no Japão, que não seria nada além de uma coqueluche artificial parida pela mídia, que fraudaria números e informações, interessados em renovar a imagem da Coreia do Sul no país. Teorias e evidências pipocam por boards da internet como o 2chan, onde investigaram e relataram que a Fuji TV é acionista de inúmeros grupos ligados ao Kpop e teria interessa na fabricação do seu sucesso – situação que fere a constituição japonesa, pois estariam camuflando propaganda como mídia jornalística.
Críticos dessa postura a condenam como fanatismo nacionalista. Um modo antiquado de enxergar o mundo e a participação do Japão na era globalizada. Essa repulsa ao diferente seria um suicídio para um país já em crise que demanda com urgência, na visão deles, medidas de reforma e abertura política. Os criticados respondem que nada têm contra coreanos ou contra a Coreia, mas que não é válido fabricar uma febre que desvaloriza a cultura nacional e desloca capital para outro país. No protesto, um depoimento dizia: “O Japão está passando por um período difícil, e não há necessidade de assistir a um canal que apoia outros países”. Independente de quem tenha razão nessa discussão, focos de resistência na terceira economia e no segundo maior mercado fonográfico do mundo não é uma boa notícia para os empresários coreanos e para a sobrevivência do seu pop.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Muitos fãs jovens ao redor do mundo experimentam a ‘onda coreana’ como uma unificação, um mecanismo de cura para suas almas feridas, e como uma saída para a auto-realização. Há alguns, no entanto, que consideram a ‘onda coreana’ como algo a ser combatido, porque eles a reconhecem como uma invasão cultural” (Park, Chang)
Gostaria de iniciar minhas considerações finais com uma advertência necessária. Por favor, não superestimem a Hallyu. Falemos um pouco também a respeito de suas fragilidades. A indústria do entretenimento coreana conseguiu se infiltrar entre gigantes e, como um todo, movimentar mais de US$ 4 bilhões nos mercados externos durante o ano passado. Uma quantia notável, mas ainda insignificante quando comparada às indústrias nacionais que de fato mandam na produção cultural do mundo. Em termos de comparação, um único jogo de videogame americano – Call of Duty: Black Ops II – arrecadou US$ 500 milhões em 24 horas. A alegoria de uma briga entre Davi e Golias nesse momento é indevida por sua inadequação, não existe a menor possibilidade de Davi ameaçar Golias, nem mesmo no longo prazo. O máximo que eles conseguirão é incomodar um pouco em certos momentos, e justamente neste ponto reside uma ameaça para a onda coreana. Enquanto se é pequeno, os grandes não se incomodam com sua existência. A partir do momento em que os coreanos começarem a morder alguma fatia do mercado alheio, retaliação e protecionismo por parte das empresas concorrentes podem fechar as portas para a Coreia em mercados essenciais. E acreditem, o impacto financeiro da Coreia no Ocidente ainda é insignificante, eles são grandes na Ásia, mas sequer arranham o Oeste. Mesmo aparecendo na MTV. Mesmo bombando no Youtube.
Protecionismo pode existir não apenas em termos de concorrência mercadológica, mas envolver protecionismo nacional. No Japão já há movimentos de tom nacionalista contrários à invasão dos produtos coreanos, enquanto na China o Partido Comunista já baixou leis limitando a transmissão de produções estrangeiras, enquanto estudam meios deles mesmos criarem uma cultura pop atrativa que não ameace seu regime – os chineses sabem que não podem ser apenas uma potência militar e política, cedo ou tarde precisarão conquistar também o coração dos outros povos [Soft Power], e não há o menor interesse de Pequim em permitir uma invasão coreana arquitetada pelo governo de Seul. A Coreia do Sul não terá vida fácil nos seus três principais mercados.
“Dez ou vinte anos atrás, estávamos preocupados com os efeitos sociais das culturas americana e japonesa no nosso país. Nós repreendemos os jovens que se satisfaziam com elas e tomamos medidas para proteger nossa cultura [coreana]. Quando as invasões americana e japonesa se converteram em invasão econômica por meio da venda de produtos culturais, nós nos irritamos e levantamos nossas vozes. Agora que ‘o sapato está em outro pé’, nós não pensamos seriamente sobre o que a Onda Coreana significa para as pessoas do outro lado” (Won Yong-jin, crítico cultural)
Uma limitação estrutural do pop coreano é sua pouca diversidade e baixa criatividade. A indústria ainda está muito refém do Kpop e dos doramas, sem nada muito significativo para combater em outras frentes. Além disso, praticamente todos os grupos musicais estão criando sob a mesma fórmula – de origem americana – e os empresários das agências admitem que o Kpop apresenta uma lacuna em inovação; apenas com dança competente, a onda não irá longe. Enquanto eles apenas emularem invenções e estilos americanos com o acréscimo de uma ‘alma coreana’, eles nunca conquistarão os mercados ocidentais que não enxergam isso como algo legítimo. Tampouco conseguem reconhecer o que seria um verniz coreano.
Uma ala de críticos culturais defende que a Coreia precisa seguir o exemplo do Japão e vender melhor a cultura nacional do país como um todo. O Japão se beneficiou do seu exotismo perante o olhar ocidental e desde o século XIX espalhou seus tentáculos pelo mundo. Da apropriação da arte pictórica nipônica pelos artistas impressionistas europeus até a propagação das artes marciais, da literatura, do vestuário entre outros tantos exemplos (o anime Ikoku Meiro no Croisée se passa nesse contexto). Cultura pop é descartável por definição. Seria necessário fazer com que pessoas de todos os cantos do planeta se apaixonem pela cultura do país para a indústria não ficar refém da fugacidade dos seus produtos. Para o futuro da onda, seria preciso que as pessoas queiram se sentir um pouco coreanas, invejem os coreanos, sonhem em fazer parte e compartilhar alguns elementos dessa cultura – como meninos colombianos fazem com a americana.
Não é uma opinião unânime. Maxwell Coll, jornalista residente em Seul, crê justamente no oposto. O esforço governamental concedido à popularização da cultura coreana, que ajudou financeira e legalmente o crescimento da Hallyu em seus primórdios, hoje se apresentaria como seu principal gargalo e ameaça. Os políticos de Seul, não interessados apenas no impacto econômico, mas sobretudo na imagem e identidade do país, estariam matando a espontaneidade do pop produzido na Coreia. Ao se esforçar para melhorar a imagem do país no exterior e aumentar a autoestima dos cidadãos, o governo estaria se intrometendo no mercado e forjando produtos com uma ‘coreanidade’ artificial.Com uma agenda política por trás, a Hallyu estaria negligenciando as demandas dos fãs – ou seja, o mercado – e superestimando o aspecto nacional de produtos que fazem sucesso justamente por seu perfil global. Nas suas palavras: “o governo, com suas iniciativas culturais e comentaristas nacionalistas, estão prejudicando os artistas coreanos e limitando o potencial da Hallyu. Eles estão fazendo um desserviço aos atores, cantores, produtores e diretores”.
Não só fragilidades e ameaças esperam os coreanos no futuro. Um papel interessante que a Hallyu já está fazendo, e impulsionará ainda mais, é a renovação da imagem interna e externa da nação coreana.Historicamente tratados e vistos como inferiores por vizinhos e dominadores, os coreanos estão conseguindo renovar essa identidade na aldeia global apesar das suas limitações sociais e geográficas.
A Hallyu também tem potencial para atacar em novas frentes. O cinema coreano hoje é um dos mais respeitados do mundo. Filmes pipoca como Oldboy e Shiri ganharam projeção internacional, ao passo que na ala cult, Kim Ki-duk faturou o Leão de Ouro no Festival de Veneza deste ano, entrando de vez para a seleção dos principais diretores da atualidade. Na literatura, escritores como Shin Kyung-sook e Kim Young-ha já estão sendo editados em mercados internacionais e podem render frutos num médio-longo prazo.
Enfim, resta-nos observar os próximos passos da Hallyu para saber se a onda ganhará força e se tornará um tsunami a encharcar mercados resistentes, ou se perderá vitalidade e findará como uma marolinha no mar do Japão.























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