Hoje é o Dia Internacional da Mulher, e eu quis aproveitar a data para falar um pouquinho sobre a mulheres no cinema.
Eu sei que não tem nada de genial em concluir que existe sexismo na indústria cinematográfica: basta observar a proporção de grandes diretores conhecidos para grandes diretoras, ou tentar pensar na obrigação implícita que grande parte das atrizes têm de ser bonitas para se manter no olho público.
E até aí, estamos falando apenas de bastidores, sem contar os filmes em si. Sem contar, por exemplo, a forma como comédias românticas reforçam certos ideais de mulher com os quais nem todo mundo se identifica, ou os filmes em que as mulheres são relegadas ao papel de “mocinha”, cuja única função é ser a recompensa do heroi no fim de uma aventura.
Eu sei que estou generalizando bastante nestes primeiros parágrafos e que o assunto do tratamento dispensado às mulheres no cinema poderia render páginas de discussão. Como eu não tenho estudo para isso, quis só reconhecer que esses problemas existem, para quem quiser depois pesquisar e aprofundar mais no assunto.
Neste post, eu vim falar do outro lado da moeda: dos filmes protagonizados por personagens femininas fortes, complexas e interessantes.
Como uma homenagem a imagem bem construída que a mulher pode ter no cinema, aqui vai uma lista cujo objetivo não é reduzir todas as grandes personagens que existem a uma escala de “Derp, essas são as cinco melhores mulheres do cinema”, mas trazer alguns dos exemplos de protagonistas interessantes, inspiradoras e profundas.
5) Scarlett O’Hara (“E o Vento Levou…”)
Essa personagem possivelmente vai ser das mais polêmicas da lista, e não sem motivos. Primeiro, não existe como negar que, por conta da época de produção e do período histórico do enredo, “E o Vento Levou…” é um filme com viés racista.
E, mesmo ignorando este fato e nos concentrando apenas na personagem que viemos discutir no post, Scarlett O’Hara não é unanimemente considerada um bom exemplo de personagem feminina. Mas vou dizer por quê eu defendo, apesar dos pesares, que ela merece reconhecimento.
Algumas das grandes reclamações a respeito da personagem: ela ainda tem boa parte de suas ações orientadas por homens (o caso tórrido com Rhett Butler, a paixonite por Ashley Wilkes), ela muitas vezes precisa contar com (e pedir) a ajuda deles para sobreviver, ela não hesita em usar charme e sedução para conseguir essa ajuda.
Mas é preciso pensar no contexto da história, ambientada no século XIX. É irreal querer encontrar uma personagem feminina totalmente emancipada neste período. E eu defendo que Scarlett é uma sobrevivente: ela sabe que armas tem à sua disposição e como usá-las para conseguir manter algum tipo de controle sobre o que vai acontecer com ela, em meio ao caos da Guerra Civil norte-americana.
Isso sem mencionar a evolução da personagem ao longo da saga: ela começa o filme como uma menina mimada e petulante e acaba se mostrando uma mulher manipuladora, sim, mas também muito capaz e perseverante.
4) Clarice Starling (“O Silêncio dos Inocentes”)
Quando se fala em “O Silêncio dos Inocentes“, a maioria das pessoas pensa logo em Hannibal Lecter, um dos personagens mais icônicos do cinema. Não é um personagem com o qual seja fácil dividir cenas, mas a agente Clarice Starling, interpretada por Jodie Foster (não vou falar da versão da Julianne Moore aqui), consegue.
A atriz (não à toa vencedora do Oscar pelo papel) encontra o equilíbrio entre a força e “dureza” de uma policial inteligente e determinada e a vulnerabilidade de uma mulher que revela boa parte de seu passado pessoal e emocional para um psicopata, em troca de respostas.
3) Hushpuppy (“Indomável Sonhadora”)
Eu pensei em colocar nesta posição a Ofélia de “O Labirinto do Fauno”. Afinal foi o ponto de vista de uma personagem sensível e perseverante, apesar de amedrontada e diante de circunstâncias quase impossíveis, que permitiu que a história fantasiosa e pesada do filme de Guillermo del Toro realmente ganhasse vida.
No entanto, quando eu penso em “Labirinto do Fauno” lembro muito mais da cinematografia e da história do que da personagem em si; ao passo que, em “Indomável Sonhadora”, os mesmos adjetivos de Ofélia se aplicam à menininha Hushpuppy e ela ainda consegue ser uma das partes mais memoráveis do longa.
Já falei um pouco de “Indomável Sonhadora” neste post sobre bons filmes de 2012. Agora, sobre a personagem, trata-se de uma criança durona, mas não excessivamente precoce; uma menininha cheia de imaginação e resiliência que precisa lidar muito cedo com mudanças muito drásticas, e que mostra estar à altura da tarefa, apesar da pouca idade.
2) Louise Sawyer e Thelma Dickinson (“Thelma e Louise”)
É bem difícil definir uma única protagonista para este filme de Ridley Scott, sobre a emancipação de duas mulheres que decidem tirar férias curtas, mas – por uma série de eventos – acabam em um caminho sem volta de problemas com a lei. Tanto é que as duas protagonistas (Geena Davis como Thelma e Susan Sarandon como Louise) concorreram ao Oscar de Melhor Atriz Principal em 1992.
Pessoalmente, eu ainda diria que é a evolução de Thelma, de esposa dominada a mulher decidida, que acaba se tornando ponto central do filme e fazendo dela a real protagonista.
Sobre o filme, alguns críticos o classificaram como feminista, pela forma como retrata certos abusos que mulheres sofrem nas mãos de homens e por mostrar o processo de reação e independência das duas protagonistas. Por outro lado, outros defendem que a temática principal do filme não são exatamente valores feministas, mas violência e retaliação.
Na minha opinião, não dá para negar que a história é de duas mulheres subvertendo expectativas que lhes são impostas e (por mais que a situação externa se torne caótica) tomando o controle das próprias vidas. Por isso, eu não poderia deixar de citar as duas nesta lista.
1) Ellen Ripley (“Alien – O Oitavo Passageiro” e “Alien – O Resgate”)
A personagem de Sigourney Weaver no terror de ficção científica aparece no topo de muitas listas de grandes personagens femininos, com um bom motivo.
Eu costumo ter um problema com a personagens femininas de filmes de ação por conta do seguinte: pensem em Angelina Jolie em “Salt“. O papel havia sido originalmente escrito para Tom Cruise e, quando ele foi substituído por uma mulher, o personagem teve que mudar pouco mais que o primeiro nome. Ainda se trata de um protagonista genérico de filme de ação que está ali para ser invencível e derrotar vilões.
E é essa, para mim, a grande diferença de Ellen Ripley: ela é forte e é uma sobrevivente, sim. Mas ela é também uma heroína real e com várias dimensões: ela é agressiva, cabeça-dura, teimosa, inteligente, traumatizada, e (em “Aliens – O Resgate”) ela é também maternal. São características que, ao invés de denegrir ou denotar fraqueza na personagem, a tornam mais complexa e humana.
Fora isso, sempre tem o bônus de que ela não passa o filme inteiro com uma roupa justa e maquiagens super improváveis para o contexto, só porque mulheres que salvam o dia também precisam ser bonitas.






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